«Nas tardes em que havia "banquete de Platão" (que assim denominávamos essas festas de trufas e ideias gerais)» (QUEIRÓS, Eça de - Civilização)
A que se segue é a segunda de uma série de receitas inventadas por mim. É que o Jacinto Galião também gosta de comer. Tal como na receita anterior, o peixe para esta receita deve ser pescado num elevador.
Começo por explicar que isto é uma
paella um bocado aldrabada. Bocado é favor. É bastante aldrabada. Baseei-me na receita original da
paella (que aprendi em Valência) mas, como não consigo seguir uma receita, modifiquei aqui e ali e o resultado, honestamente, não é uma
paella, é mais um
risotto de peixe na
paellera. Perdoem-me os puristas mas, com um bisavô italiano e outro espanhol, eu só podia saír assim desalinhada...
RISOELLA DE PEIXE
Esta receita começou por se denominar Paella de peixe. Depois, decidi seguir a sugestão do meu amigo do
Ars Coquinaria e mudei-lhe o nome, já depois da receita ter sido publicada. Não é muito ortodoxo alterar
posts publicados mas quem faz um
risotto numa
paellera tem desculpa...
Azeite virgem
Alho
Tomate
Pimento verde
Açafrão da Mancha
Sal
Arroz
Peixe branco e carnudo (cherne, tamboril...)
Dou um violento murro no dente de alho (costuma ser inspirador pensar no nariz do meu pior inimigo) usando o lado de uma faca e frito-o no azeite que aqueci numa
paellera (ou, na falta dela, numa frigideira grande). Deixo dourar bem mas, antes de começar a queimar, retiro para não amargar. A seguir, deito o tomate cortado em pedaços e frito-o bem. Isto é básico: a
paella não leva refogado; a base é a fritura em azeite.
Por esta altura, junto o pimento cortado em tiras muito fininhas e completamente livre de sementes e da parte esbranquiçada da polpa (são as sementes e esta polpa esbranquiçada que o tornam indigesto, aprendi isto com o chef Vítor Sobral).
Deixo fritar muito bem.
Junto então o arroz e frito-o. A aldrabice começa aqui. Na receita original da
paella não se frita o arroz. Mas eu frito. Entretanto, desfaço muito bem uns estames de açafrão (para uma caneca de arroz uso uma colher de chá de açafrão).
Para quem pensa que o açafrão só dá côr e que, para isso, não vale a pena comprar a especiaria mais cara do mundo, fica a informação: o açafrão genuíno dá um sabor e um aroma muito subtis mas persistentes e inconfundíveis. Faz toda a diferença mas, pela sua subtileza, é preferível não usar outras ervas.
Junto ao arroz água a ferver, até cobrir, e é nesta altura que deito o açafrão e tempero de sal.
A aldrabice continua aqui: a
paella transforma-se numa espécie de
risotto porque eu vou deitando água a ferver à medida que consome (e consome muito porque a
paellera, como é larga, promove a evaporação).
Quase no fim da cozedura, com o arroz ainda bem ensopado, espalho o peixe cortado em cubos. O peixe coze depressa, mas é preciso estar com muita atenção porque o arroz também pega facilmente por causa da rápida perda de água. Nesta fase, o equilíbrio entre o tempo de cozedura do peixe e o grau de evaporação/secura do arroz é muito precário: se o arroz seca de mais, o peixe não tem tempo de cozer, se se deita mais água para o peixe cozer, o arroz fica demasiado "malandrinho" e isso não é suposto numa
paella. Como não sou uma cozinheira experiente, às vezes a coisa não sai lá muito bem mas, quando sai bem, este prato fica uma delícia!
Bom apetite!