Corria o ano de 1985, ano extraordinário. 1985 foi um daqueles anos raros em que se sentiu a História a acontecer. Tal como sentiram os que viveram o ano de 1939 e todos sentimos em 2001.
Mikhail Gorbachev assumia o puder supremo do Império Soviético e lançava a Perestroika. Nada seria como dantes e nós percebemos isso.
Elton John compunha Nikita, aquela canção deliciosamente banal que andou nos ouvidos e na boca de toda agente. Nikita era aquela moça de olhos transparentes que guardava uma fronteira, mas era também o nome próprio de Krushov... «Oh Nikita you will never know, anything about my home... And if there comes a time Guns and gates no longer hold you in And if you're free to make a choice Just look towards the west and find a friend».
E o Live Aid! Esse concerto único, acompanhado gulosamente pela televisão, em que uma geração de adolescentes que crescia já em liberdade e pouco dada a ideais, teve o seu momento idealista, o seu cheirinho de anos 60, de peace and love, de Woodstock.
Eu, caloira em História, vivia a crise da Livre (a única universidade privada de então) e tentava concentrar-me para as frequências, enquanto os alunos das públicas - principalmente da Clássica - não tinham mais que fazer que manifestações contra o ensino superior privado. Eles, que podiam passar oito ou dez anos nos copos a fingir que faziam o curso porque, nessa época, não o pagavam, ao contrário de nós que pagávamos os nossos e os deles. Adiante, o que lá vai, lá vai...
Esquerda e Direita, Leste e Ocidente, «Progresso» e «Reacção», era essa a dicotomia neste já longínquo ano de 1985. Os russos - essa diabólica ameaça! - invadiam países estrangeiros para lhes imporem governos favoráveis. Nada que aconteça hoje, não senhor.
Realmente, eu fui daqueles que respiraram de alívio, que viram uma luz ao fundo do túnel, que imaginaram um futuro risonho, um longo período de paz e prosperidade para a espécie humana, quando finalmente caísse o Império Soviético.
Enquanto isso, Sting lembrava que os nossos «inimigos» também amam os seus filhos. Mas alguém se lembra disso?...
7 comentários:
Porém o mundo não está mais seguro, pois não?
Em lugar de termos dois grandes paises a ameaçarem, temos apenas um com ideias profundamente hegemónicas..
O Mundo só será melhor qd todos tomarmos consciência de que a guerra não nos conduz a lado algum. Ah, e quando formos capazes de não votar em cretinos que nos atrofiam. Mas para que tudo isto aconteça, muito tem de mudar. Sobretudo a grande e incontornável questão culural.
Beijo
Mas o idealismo ficou...
We share the same biology
Regardless of ideology
Believe me when I say to you
I hope the Russians love their children too
Obrigado pela memória.
Grande Canção ...
1985 ... também eu caloira em História na "nossa" Livre, porque a preferi à Católica (onde havia entrado em Direito) por estar mais próxima do meu amado Conservatório. Ainda bem, teria dado uma péssima advogada e ... não teria conhecido uma das pessoas mais importantes da minha vida ... tu!!
Quanto ao "acontecer da História", senti-o mais em 89 quando caiu o muro de Berlim.
Em relação aos dias de hoje, subscrevo o que disse o postscriptun.
Mil beijos,
MRF
és mázinha com os colegas da pública (eu ...)
e, claro que me lembro dessa música do Sting
"The Dream of the Blue Turtles", o primeiro e quanto a mim de longe o melhor álbum do Sting a solo.
Esta canção (baseada numa frase musical de Sergei Prokofiev) é belíssima, mas gosto também muito do worksong "We work the black seam", um apoio à luta dos mineiros em Inglaterra naquela época.
Um visão interessante de 85. É um ano amorfo da minha vivência pessoal: nada extraordinário nem dissemelhante de 84 ou 83. Vendo agora, e dos acontecimentos que menciona, foi o preãmbulo da flexissegurança. Ou o retorno ao capitalisno novecentista...
Não tenho muita saudade dos anos 80.
Cumpts.
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