Morreu Vasco Granja.
Mal compreendido pelas gerações anteriores à minha e praticamente desconhecido da geração mais jovem, Vasco Granja marcou a minha geração, aquela que cresceu e fez a sua escolaridade nos dez anos posteriores ao 25 de Abril de 1974. Foi mal compreendido pelas gerações anteriores à minha porque estavam habituadas aos desenhos animados americanos do Woody Woodpecker e do Daffy Duck (desenhos magistrais de técnica, humor e divertimento, que eu adorava) e não percebiam o interesse daqueles programas com desenhos de países estranhos em línguas estranhas, em que nunca caíam pianos em cima de coiotes. Numa época de forte politização, em que nada nem ninguém era apolítico, é compreensível que fosse baixa, para uma parte da população, a aceitação desses desenhos dos países da "cortina de ferro".
O objectivo de "Cinema de Animação", contudo, nunca foi apenas passar desenhos animados. Nunca pretendeu ser um programa de divertimento puro e simples. Chamava-se "Cinema de Animação" e era um programa sobre cinema de animação, enquanto género cinematográfico, enquanto arte e enquanto técnica.
Não era um programa para crianças ou apenas para crianças, embora pudesse ser e fosse visto maioritariamente por crianças. Era educativo. Foi Vasco Granja que me deu a conhecer a animação com sombras chinesas, com bonecos de plasticina, com bonecos recortados e com outras técnicas cujos nomes desconheço, muitos deles vindos de países de leste, é certo, mas também do Canadá, da República Federal da Alemanha, da Suécia ou da Austrália e mesmo dos Estados Unidos.
Vasco Granja divulgou géneros e cineastas que, de outra forma, nunca chegariam à televisão e que nunca passariam - nem passam hoje! - dos cineclubes e dos festivais. Apresentava desenhos de carácter artístico, desenhos didáticos e também lúdicos. Mostrou-nos línguas estranhas como o polaco e o romeno e, para mim, que lia fluentemente desde os cinco anos, foi uma novidade deliciosa ler as fichas técnicas em romeno e perceber que, afinal, até conseguia ler e perceber muitas palavras dessa língua distante.
Li que os seus programas duraram na RTP desde 1974 até 1990. No final dos anos oitenta já não os via, até pensei que tivessem acabado mais cedo. Não sei qual o seu impacto na geração a seguir à minha mas sei que a minha geração não esquecerá nunca Vasco Granja nem o Lápis Mágico.
Koniek.
Mal compreendido pelas gerações anteriores à minha e praticamente desconhecido da geração mais jovem, Vasco Granja marcou a minha geração, aquela que cresceu e fez a sua escolaridade nos dez anos posteriores ao 25 de Abril de 1974. Foi mal compreendido pelas gerações anteriores à minha porque estavam habituadas aos desenhos animados americanos do Woody Woodpecker e do Daffy Duck (desenhos magistrais de técnica, humor e divertimento, que eu adorava) e não percebiam o interesse daqueles programas com desenhos de países estranhos em línguas estranhas, em que nunca caíam pianos em cima de coiotes. Numa época de forte politização, em que nada nem ninguém era apolítico, é compreensível que fosse baixa, para uma parte da população, a aceitação desses desenhos dos países da "cortina de ferro".
O objectivo de "Cinema de Animação", contudo, nunca foi apenas passar desenhos animados. Nunca pretendeu ser um programa de divertimento puro e simples. Chamava-se "Cinema de Animação" e era um programa sobre cinema de animação, enquanto género cinematográfico, enquanto arte e enquanto técnica.
Não era um programa para crianças ou apenas para crianças, embora pudesse ser e fosse visto maioritariamente por crianças. Era educativo. Foi Vasco Granja que me deu a conhecer a animação com sombras chinesas, com bonecos de plasticina, com bonecos recortados e com outras técnicas cujos nomes desconheço, muitos deles vindos de países de leste, é certo, mas também do Canadá, da República Federal da Alemanha, da Suécia ou da Austrália e mesmo dos Estados Unidos.
Vasco Granja divulgou géneros e cineastas que, de outra forma, nunca chegariam à televisão e que nunca passariam - nem passam hoje! - dos cineclubes e dos festivais. Apresentava desenhos de carácter artístico, desenhos didáticos e também lúdicos. Mostrou-nos línguas estranhas como o polaco e o romeno e, para mim, que lia fluentemente desde os cinco anos, foi uma novidade deliciosa ler as fichas técnicas em romeno e perceber que, afinal, até conseguia ler e perceber muitas palavras dessa língua distante.
Li que os seus programas duraram na RTP desde 1974 até 1990. No final dos anos oitenta já não os via, até pensei que tivessem acabado mais cedo. Não sei qual o seu impacto na geração a seguir à minha mas sei que a minha geração não esquecerá nunca Vasco Granja nem o Lápis Mágico.
Koniek.
6 comentários:
Sempre com o devido respeito, que é todo, pela opinião contrária, ainda que de recente data, se a memória não me atraiçoa, tenho de expressar total discordância deste post.
Não falo, claro, das qualidades pessoais de Vasco Granja, que não conheci e que acredito que fosse excelente pessoa, até pela sua actividade ligada à arte e aos jovens. Mas, quem constrói uma imagem pública sabe, porque é inevitável, que deixa marcas que não domina, causa impressões que não deseja e influencia o que nem conhece. É assim. É a vida...
Caso não te lembres, Vasco Granja apareceu na RTP com um programa de desenhos animados que, como Jorge Alves anunciava no Cartaz TV, seria de uma hora ininterrupta de diversão "para os mais pequeninos". Foi assim que nos conquistou, foi assim que criou o seu público, foi assim que tomou lugar como nosso herói. Ele trazia-nos o Daffy e o Bugs Bunny!!!
Mas Vasco Granja tinha a sua "agenda" e a sua ideologia. E nós, que apenas tínhamos idade para uma "agenda" de riso e galhofa, começámos a ver traídas as expectativas com o súbito varrimento dos écrans daqueles ídolos que, entre correrias e partidas, povoavam o nosso imaginário. E fê-lo com astúcia, pois, passado o tempo inicial de fidelização em que nos dava o que queríamos, começou a pregar-nos grandes secas, que nós tínhamos de aturar, pois, logo no início dos programas, ele vinha, em tom doce e insinuante, prometer que, no final, haveria Speedy Gonzalez, ou Woody Woodpecker. Ou seja, sabendo que ninguém, no seu juízo normal, perderia um minuto de brincadeira para ver a última novidade de algum jovem cineasta polaco ou checo, mantinha-nos suspensos à espera de uma pequena recompensa depois de tanta tortura. Este método pavloviano, que não surpreende na propaganda bolchevique, causou um corte que jamais foi sarado. Se tais curiosidades fossem boas, não teriam de ser impingidas. Mas, ainda que valessem a pena, o método usado era desleal, sectário e próprio de um ministro da informação e não de um defensor do livre pensamento.
Goebbels, o mestre da propaganda, bom chefe de família, pessoa culta, grande amigo dos jovens, acreditava que a televisão seria o melhor instrumento de formatação das gerações futuras.
Tinha razão, sendo desnecessário acrescentar que a arte e a ideologia sempre se deram como irmãs. Talvez isso se aplique a burgueses como Spielberg ou George Lucas. Talvez Roger Rabbit seja o ícone de qualquer coisa indefinível que nos deixa alienadamente felizes. Mas, apesar do que possam dizer os ideólogos marxistas, nunca me apercebi de que o sentido crítico de alguém fosse diminuído por uma boa gargalhada ou por uma lágrima furtiva. Há vida para além do Gulag da luta de classes, dos livros proibidos e dos desenhos animados aprovados pelo partido.
Não. Não é verdade que uma parte da população não aceitasse aqueles desenhos. Aquilo era intragável e só a distância, que tudo atenua, permite ocultar os protestos infantis e juvenis que se ouviam por causa da pimpineira que tanto nos atormentava. Para nós, o problema não era ideológico. Era estético!
Espero, sinceramente, que Vasco Granja tenha sido feliz e que o seu espírito redimido vagueie, eternamente, no Paraíso das Merry Melodies.
KPAN
Lamento, mas não concordo nada com o seu texto.
Apesar da sua simpatia e conhecimento da matéria em causa, Vasco Granja serviu de "ponta de lança" à ideologia para divulgar um tipo de "cinema de animação" feito de acordo com essa mesma ideologia. Não mais que isso.
Fugazes, esses filmes apareciam e desapareciam, tal a falta de graça, de poder de atracção, e a "mensagem" sempre presente.
Era simpático e culto, mas ficou "colado" a um período que a minha geração não esqueceu. E não é por ter morrido agora que se pode passar uma esponja sobre os interesses que pretendeu servir.
Bahhh!
Viva o Vasco Granja... Parabéns pela bonita homenagem que fizeste no Blog.
E eu nem gostava muito dos filmes de animação que ele passava.
É claro que me marcou e me influenciaram os seus programas. Ele Não fazia programas e não passava filmes sem idiologia ou sem conteúdo, e sem querer passar alguns valores. Os que ele passava eram valores bons ou positivos. Eram pedagógicos.
Não acredito que alguém ligado à BD, ao cinema de animação, ao desenho artistico ou que goste da área do desenho não tenha um grande respeito e consideração pelo trabalho de divulgação cultural que o Vasco Granja fez na RTP.
Se me influenciou para ser tolerante, contra extremismos , contra perseguições idiológicas, contra preconceitos de extrema- direita, então só lhe posso estar muito agradecido pela influência que teve na minha visão das coisas.
De certeza que não foi pelos seus programas que a extrema-direita fascista está hoje no poder em várias cidades italianas, como em Roma por exemplo. E Que na Austria e na Suécia existam grupos ultranacionalistas fortissimos, E que na América se utilizem técnicas de tortura contra prisioneiros, etc...
Isto de julgar fora de tempo é coisa fácil... ou seja, é fácil julgar "hoje", descontextualizando. Mas o contexto é fundamental. E sim, concordo com a homenagem deste post, pelo muito que Vasco Granja fez por uma arte então tão afastada do nosso quotidiano.
E concordo porque... sendo verdade que Vasco Granja subscreveu uma ideologia, a sua prática tem de ser avaliada segundo o tempo em que os seus programas passavam. Era assim então, pronto. Tal como antes fora com a censura, pronto.
Não deveria ser, mas era como era, em seu tempo. [na verdade, duvido até que hoje seja diferente]
Como a Clara diz, era o objectivo passar desenhos animados? Não. Não era um programa para crianças ou apenas para crianças. Só que isso talvez não fosse entendido na altura.
ok ok dirão… mas ele começava com um "Olá Amiguinhos".
Pois, aí concordo com as vozes oponentes :))), essa saudação a abrir era tendenciosa, bem que ele a podia ter dispensado, mas não se pode ser perfeito.
Mas vejamos ainda, e no que respeita ao programa ser dirigido a um público outro para lá do infantil. Se formos por aí, grande parte dos contos infantis – contos de fadas incluídos – também se dirige a [ou apenas a / ou fundamentalmente a] um público infantil? Não!
Capuchinho Vermelho [vou tomar este como exemplo] e afins não são também contos para crianças. Tirados do folclore, alguns eram mesmo, nas suas origens, carregados de violência, bem sangrentos e/ou eróticos, entretinham adultos [isto dava para uma grande conversa].
O Vasco enganava as criancinhas? Bom… se formos rígidos, então hoje é mais condenável continuar a contar o Capuchinho Vermelho a meninos e meninas, pois também a intenção é falaciosa, enganadora.
E falaciosa e enganadora HOJE. E sabemos dela HOJE. E estamos HOJE esclarecidos. Porque é, hoje, bem sabido que este conto em particular contém uma outra mensagem - bem erótica, aliás - da passagem da menina à adolescente. Vermelho conota-se com o período menstrual, com a passagem da menina a jovem sedutora. E o lobo - mau :) - figuração do elemento masculino que esta, a jovem, seduz.
Vamos desaprovar, também, os contos infantis? Sejamos tolerantes e, terminando por onde iniciei, avaliemos o valor desprendendo-nos de conotações políticas e tendo em conta o contexto histórico dos mesmos programas.
Merecida homenagem Clara.
Acrescento, ainda, tendo em conta o último comentário, duas notas: em primeiro lugar, não é preciso ser versado em "mistérios" psicanalíticos para apreciar um bom filme de animação, pois a tal "mensagem" passa pela percepção intuitiva e não pela explicação racional, em especial quando se têm 8, 10 ou 12 anos; em segundo lugar, esses contos imortais de J. Grimm ou de H. C. Andersen foram magistralmente transpostos para o cinema de animação precisamente pelos cineastas norte-americanos que a purga ideológica de 1974 baniu do nosso horizonte, como se veneno fossem.
Ou seja, nem na forma nem no conteúdo os desenhos animados preferidos por V. Granja seduziram ou educaram. Só mesmo quem, pela idade, não saiba ao que me refiro (o que é natural, porque ser jovem não é defeito e eu gostaria de ainda o ser...) pode adoptar essa posição tão ingénua relativamente à lavagem cerebral que se visou.
Mas, encurtando razões, eu não estou a condenar HOJE o V. Granja. Nada disso! Eu estou HOJE a expressar a condenação que fiz em juventude. E que mantenho, em nome do meu vilipendiado direito de outrora a ver os desenhos que nos faziam felizes.
saudades desse programa !
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