Aviso: na biblioteca de Jacinto não se aplicará o novo Acordo Ortográfico.

25 fevereiro 2016

Pai

Pai, Dizem-me que Ainda Te Chamo

Pai, dizem-me que ainda te chamo, às vezes, durante
o sono - a ausência não te apaga como a bruma
sossega, ao entardecer, o gume das esquinas. Há nos
meus sonhos um território suspenso de toda a dor,
um país de verão aonde não chegam as guinadas
da morte e todas as conchas da praia trazem pérola. Aí

nos encontramos, para dizermos um ao outro aquilo
que pensámos ter, afinal, a vida toda para dizer; aí te
chamo, quando a luz me cega na lâmina do mar, com
lábios que se movem como serpentes, mas sem nenhum
ruído que envenene as palavras: pai, pai. Contam-me

depois que é deste lado da noite que me ouvem gritar
e que por isso me libertam bruscamente do cativeiro
escuro desse sonho. Não sabem

que o pesadelo é a vida onde já não posso dizer o teu
nome - porque a memória é uma fogueira dentro
das mãos e tu onde estás também não me respondes.

(Maria do Rosário Pedreira, in 'Nenhum Nome Depois')

2 comentários:

Anónimo disse...

Que importante é ter Pai!
Reveja-se os posts de Maria do Rosário Pedreira.

«A generation which ignores history has no past — and no future.»
Robert Anson Heinlein

MCA disse...

Há três anos que ponho poemas dela neste dia.