Aviso: na biblioteca de Jacinto não se aplicará o novo Acordo Ortográfico.

14 agosto 2007

Batalha de Aljubarrota

Batalha de Aljubarrota In: Crónica de Froissart, British Library.

«Não falta com razões quem desconcerte
Da opinião de todos, na vontade,
Em quem o esforço antigo se converte,
Em desusada e má deslealdade,
Podendo o temor mais, gelado, inerte,
Que a própria e natural fidelidade,
Negam o Rei e a Pátria e, se convém,
Negarão (como Pedro) o Deus que têm.

«Mas nunca foi que este erro se sentisse
No forte Dom Nuno Álvares; mas antes,
Posto que em seus irmãos tão claro o visse,
Reprovando as vontades inconstantes,
A aquelas duvidosas gentes disse,
Com palavras mais duras que elegantes,
A mão na espada, irado e não facundo,
Ameaçando a terra, o mar e o mundo:

«"Como da gente ilustre Portuguesa
Há-de haver quem refuse o pátrio Marte?
Como, desta província, que princesa
Foi das gentes na guerra em toda parte,
Há-de sair quem negue ter defesa?
Quem negue a Fé, o amor, o esforço e arte
De Português, e por nenhum respeito,
O próprio Reino queira ver sujeito?

«"Como, não sois vós inda os descendentes
Daqueles que, debaixo da bandeira
Do grande Henriques, feros e valentes,
Vencestes esta gente tão guerreira?
Quando tantas bandeiras, tantas gentes
Puseram em fugida, de maneira
Que sete ilustres Condes lhe trouxeram
Presos, afora a presa que tiveram?

«"Com quem foram contino sopeados
Estes, de quem o estais agora vós,
Por Dinis e seu filho sublimados,
Senão c'os vossos fortes pais e avós?
Pois se, com seus descuidos ou pecados,
Fernando em tal fraqueza assi vos pôs,
Torne-vos vossas forças o Rei novo,
Se é certo que co Rei se muda o povo.

«"Rei tendes tal que, se o valor tiverdes
Igual ao Rei que agora alevantastes,
Desbaratareis tudo o que quiserdes,
Quanto mais a quem já desbaratastes.
E, se com isto, enfim, vos não moverdes
Do penetrante medo que tomastes,
Atai as mãos a vosso vão receio,
Que eu só resistirei ao jugo alheio.

«"Eu só, com meus vassalos e com esta
(E, dizendo isto, arranca meia espada),
Defenderei da força dura e infesta
A terra nunca de outrem subjugada.
Em virtude do Rei, da pátria mesta,
Da lealdade já por vós negada,
Vencerei (não só estes adversários)
Mas quantos a meu Rei forem contrários!"»

(Os Lusíadas. Canto IV. Transcrição com ortografia actualizada a partir da edição de 1872.)

11 comentários:

Pedrita disse...

gostei muito do seu blog. do camões sempre gostei mais das poesias líricas, mas lusíadas é realmente maravilhoso. sou brasileira. aqui no brasil muitas bibliotecas são gratuitas, até mesmo de algumas instituições privadas e foram essas bibliotecas que ajudaram na minha formação cultural. teve um tempo que até comprar em sebo não era possível e eu era sócia gratuitamente de 5 bibliotecas e escolhia sempre algo em alguma delas. tenho especial carinho por bibliotecas. gostaria muito que visitasse o meu blog. especialmente nessa semana falo um pouco de literatura. beijos, pedrita

Pedrita disse...

na verdade foi na semana passada, então segue o link com os posts sobre literatura http://mataharie007.blogspot.com/search/label/literatura obrigada

PostScriptum disse...

Eis uma excelente descoberta. Refiro-me, claro, ao teu blog.
Bj

Paulo Vinhal disse...

A Biblioteca de Jacinto faz agora parte das estantes do
http://arte-sem-muros.blogspot.com

Prende os teus cabelos num alfinete de ouro;
E prende cada trança vagabunda;
Pedi ao meu coração para fazer estes pobres versos;
Neles trabalhou, dia após dia,
Edificando de antigas batalhas
Uma dolente formusura.

Basta levantares a tua mão nacarada
E prenderes os teus longos cabelos e suspirares,
Para que o coração dos homens arda e palpite;
E a espuma como uma vela sobre a areia opaca,
E as estrelas que trepam ao céu de orvalho,
Só vivem para iluminar os teus pés que passam.

Abraço do Paulo Vinhal

PostScriptum disse...

Tomei a liberdade de te linkar. Espero não ter ultrapassado as marcas com isso.
Um beijo

Paulo Vinhal disse...

Como devem ter percebido o poema que transcrevi é do Yeats. No meu blog publiquei dois poemas meus, mas não passo de um amador.

Abraços do Paulo

MCA disse...

Oops! eu não reconheci...
Obrigada pela rectificação. O seu a seu dono!

Paulo Vinhal disse...

Não acredito, hehehe...
Beijinhos

Paulo Vinhal disse...

Divina Guarda, angélica, celeste,
Que os Céus, o Mar e a Terra senhoreias:
Tu, que a todo Israel refúgio deste
Por metade das águas Eritreias;
Tu, que livraste Paulo e defendeste
Das Sirtes arenosas e ondas feias,
E guardaste, co´os filhos, o segundo
Povoador do alagado e vácuo mundo:

Lvis Vaz de Camoes
livro 6 / versículo 81

Anónimo disse...

Concordo com o José Hermano Saraiva (não apenas nisto, entenda-se, pois sou admirador do homem, contra a opinião da intelectualidade bem-pensante): o "maior português" foi Camões, porque (e estas são apenas as minhas razões) ele é o autor do "Portugal pensado", da representação colectiva da nacionalidade. Além de poeta, ele é o nosso primeiro e maior ideólogo. Ele deu um sentido inteligível (portanto, "histórico") ao tempo e aos factos, síntese do que fora e do que deviria.

MCA disse...

Concordo. Eu não votei nessa coisa do maior português e, se o tivesse feito, hesitaria entre D. Afonso Henriques e Camões. Mas quase de certeza que acabaria por escolher Camões. D. Afonso Henriques, na verdade, não era português (tal como Jesus não era cristão); faltava-lhe o passado, o sentido de pertença.