«O novo acordo ortográfico tem três tipos de problemas. Os dois primeiros são puramente políticos e o terceiro é linguístico.»
Continuar a ler "Incompetência linguística, oportunismo e mentira política" no De rerum natura.
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4 comentários:
Não há dúvida que o desacordo é grande, como tantas medidas tomadas últimamente. Estou convencida que a confusão será tal, que acabará por ficar tudo como está, fica o dito pelo não dito.
(Publicado no SEMANÁRIO de 7-11-2008)
Português ou “akordês”?
A polémica em torno do acordo ortográfico não é nova, nem é interessante. Tratado político com motivações não esclarecidas (o que logo indicia que não é coisa boa, pois, se o fosse, nada haveria a esconder...), é um documento contestado por linguistas, escritores, professores, enfim, por todos os que deveriam sufragá-lo. Os mais relevantes e premiados escritores da língua portuguesa, ainda que sem a nacionalidade portuguesa, têm falado contra o acordo. Apenas “meia-dúzia” de personalidades, cuja autoridade não posso contestar por não a conhecer, continua a afirmar que o acordo é bom.
Pessoalmente, não acho que a maioria tenha razão só por ser maioria. Aliás, não sinto a angústia de ficar orgulhosamente só, até porque a expressão “orgulhosamente só” não me causa qualquer complexo esquerdista (mal de que, decididamente, não sofro). Porém, quando as pessoas que sabem mais do que eu são quase unânimes em certa matéria, sinto ser meu dever parar e pensar. Eis o conselho que daria, se me fosse pedido, aos entusiastas do acordo do Dr. Casteleiro.
Dito isto, posso agora acrescentar que o acordo, na parte que já conheço (e já conheço o suficiente...), constitui um insuportável disparate. Desde logo, porque vem tirar coerência formal à ortografia, sem deixar nada em troca, ou seja, muda-se porque sim, muda-se porque é a lei, muda-se porque o Dr. Casteleiro já pensou por nós; e quem não quiser mudar é um atrasado arrogante, que não é capaz de viver nos novos tempos!
Mas, além da questão ortográfica, propriamente dita, há a realidade política de o acordo ser, no geral, uma alteração na grafia do português da Europa, a qual passa a ser... brasileira, isto é, o acordo é um favor que os brasileiros fazem aos irmãos portugueses, que passam a ter o privilégio de escrever em “brasileiro”.
Ou seja, no plano político, o acordo não serve qualquer interesse nacional. Todavia, parece servir vários interesses de nacionais, os quais, já engordados de impostos, mas sempre insaciáveis, vão alargando os respectivos negócios ao espaço geográfico, social e económico da chamada “lusofonia”, onde, inconfessàvelmente, fazem o discurso estafado da “herança cultural comum” para esconder o percurso dos lucros ilegítimos próprios.
Acontece que o acordo é apresentado como facilitador da aprendizagem da língua. Ora, aqui é que eu tenho dificuldade em contestar ou argumentar, porque não posso questionar tal razão.
Na verdade, o fácil e o difícil são subjectivos, o que é fácil para uns é difícil para outros e ninguém pode impor o fácil, desrespeitando as eventuais dificuldades cognitivas alheias. Por exemplo, os entusiastas do Dr. Casteleiro não são obrigados a gostar da disciplina de português; e, com eles, é sabido que muitos milhares de alunos a detestam! Haveremos de obrigá-los a uma dolorosa aprendizagem, apenas porque alguns de nós achavam graça àquela coisa dos verbos, dos acentos, das preposições e dos pronomes? E que interesse têm tais minudências na Zona J ou na Quinta do Mocho?
Em suma, ainda que cientìficamente errado ou polìticamente perverso, o acordo corresponde a uma relevante necessidade social: a de acabar de vez com essa trapalhada da língua portuguesa, fonte de reprovações e dissabores para os estudantes menos favorecidos, os quais podem, doravante, contar com novas e estimulantes medidas de largo alcance social em outras áreas disciplinares. Refiro-me, naturalmente, à Geografia, à Matemática, à História, ao Inglês, etc., onde alguns ajustamentos programáticos e a ausência de exames (mais uma medida genial que se anuncia) poderão converter o jovem rapper, de boina e naifa, num doutor, antes dos 18 anos.
Aí, sim, veremos os portugueses a passarem finalmente à frente dos estrangeiros, sem abandono escolar, sem chumbos, sem livros, todos na net como o Governo gosta, mostrando ao mundo a sua cultura avançada e democrática!
Eis como eu tenho de me dar por vencido, ainda que, por incurável senilidade cultural, não consiga imaginar-me a usar outra ortografia que não a da minha saudosa professora primária. Aliás, retomei o uso do acento grave, em substituição do acento agudo, sempre que à palavra se apõe um sufixo, como aprendi e era norma antes do acordo de 1972. Se uma das vertentes do acordo é a da liberdade de escolha da forma ortográfica, cá estou eu a aproveitá-la, em pleno. Óbvia e entusiàsticamente.
F. do Valle*
Portugal, 17 de Outubro de 2008
* F. do Valle é português, anarquista e não tem currículo
F. do Valle, nem sempre estamos de acordo mas, nisto do acordo, concordamos. De resto, desassombrado como sempre.
De passagem só para dar-lhe a conhecer que ainda existo.
Até sempre.
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